Havia sopa à noite em minha casa de criança. Sopa de massa de sopa. Sabe aquelas de toucinho e carnes gordas? Com cheiro de sal e óleo no fogo, cor nenhuma e promessa de satisfação alguma? Aquele líquido quente arrasado em prato fundo e fluido, ralo, minguado, transparente na fluidez? Era assim que era.
Submersos, pequenos círculos levemente amarelados de massa de macarrão.
Submersos, pequenos círculos levemente amarelados de massa de macarrão.
Meu pai, na cabeceira, que ria de si mesmo rindo-se da própria pobreza, ciente da existência de umas tais massas de sopa com o alfabeto completo, observava os círculos e cunhava:
– Enquanto não tem sopa de letrinha vão aprendendo o Ó. – E ria.
Mãinha, autora do prodígio culinário notívago, ficava arrasada com meu desprazer em engolir o caldo. À superfície, coágulos de gordura, tal qual amebas gigantes, gravitavam num ato de se entrefundir e repelir esperando a deglutição. Era a pior imagem. E mãinha ainda falava entre um tapão e outro:
– Toma sua sopa menino isso é o suor de seu pai.
3 comentários:
Perfeito!!!
Sopa de letrinha Adorei! fico a imaginar a sua cara olhando pra sopa..deve ter sido a mesma que o Lucas fez, qndo só de maldade usei a mesma frase: Toma logo Lucas, isso é o suor do seu Pai. rsrsrs
Muito boa., Adorei
Ahahah!
Eu amava sopa de letrinha. Aliás, amo sopa.
Bj
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