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sexta-feira, 26 de março de 2010

Por um trem

Era no mesmo vestido de anarruga que ela atravessava a praça todos dias à mesma hora. Luvinhas de renda branca, chapéu de palhinha e sapatos de fivela. Sorria e caminhava, como caminhava sorrindo sempre, todos os dias.
Ao chegar, subiria, cerimoniosamente, os degráus da frente como se fossem os de uma catedral, atravessaria o saguão vazio, ainda repleto de bancos longos de madeira polida e após a porta sempre aberta, alcançaria a plataforma. Ali ela esperaria. Ali não sorriria. Ali, ela olharia serena o horizonte remoto até onde a vista alcançava e os trilhos se encontravam.
O vento, vez por outra, faria bater as janelas despidas de vidros e lembranças, levantaria o pó acumulado ao passar dos tempos e removeria seus cabelos pretos e anelados, soltos aos ombros.
Nada a faria mudar a impávida expressão imersa em espectativa. Seriam dois olhos negros no horizonte, duas pintas no rosto e dois sapatos de fivela e dois trilhos vazios a se encontrar no mesmo horizonte.
Após horas de espera, ela retornaria no caminho regresso sob o olhar de toda a cidade.
Niguém nunca soube se ela esperava alguém chegar ou se esperava por um trem que a levasse dali. Havia anos que a grama cobrira parte dos velhos trilhos, havia anos que o enorme relógio estava parado, havia eras que ali, não mais passavam trens.
Aos fins de um Março qualquer, a mesma cidade esquecida às beiras da ferrovia, a viu passar no mesmo vestido de anarruga. Aos fins daquela tarde naquele Março qualquer, ela não retornou da estaçao, ninguém nunca mais a viu e nem mesmo o vento passou pelos velhos trilhos.

2 comentários:

Erica Vittorazzi disse...

Enfim, ela saiu da estação!!! Sempre chega este dia!!

Beijos David

Erica Vittorazzi disse...

Enfim, ela saiu da estação!!! Sempre chega este dia!!

Beijos David