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Menino besta cheio de sonhos aprisonado no corpo de um homem sóbrio e cheio de desejos.

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terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Invisível

Era invisível. Era invisível quando ela deixava a casa dos patrões pelos fundos da cozinha, quando ele se curvava a polir o couro dos sapatos, quando ele apertava os botões do elevador enquanto abria e fechava a porta de metal frio, quando ele despedia-se dos zelados envelopes à porta das casas, quando ela estendia o troco pela meia lua aberta no pé do vidro, quando ele oferecia-lhe a xícara de café e sumia em silêncio como a fumaça da fervura, quando ela só, à noite, aspirava e aspirava mais, kilômetros de carpetes ainda frios do ar condicionado, quando ele subia nos postes das ruas e remendava conversas esticadas em fios negros, quando ele sentava-se à porta do prédio, a olhar a imagem estática da garagem, na pequena TV preto e branco, quando ela lhes oferecia uma rosa de papel vermelho por entre as mesas ruidosas, quando carimbava, quando costurava, quando soldava, quando lavava, quando desentupia, quando esculpia, quando empacotava, quando imprimia, quando trocava as fraldas de um filho que não seu, era invisível.
Não sei se a invisibilidade trás alguma alegria, só sei que deve haver nisso um muito de paz.


5 comentários:

Mafê Probst disse...

Eu gosto desse mundo imaginário. Ele me caí bem, quase sempre. — É, as vezes, me traio.

Pâmela Marques disse...

Eu pude ver cada personagem descrito aqui como se estivesse em um filme. Ser invísil também não é. Dói de diversas formas.

Unknown disse...

Olá David,

Talvez não lembre de mim...conheci você numa festa de Bodas de Prata, nós conversamos um pouco...eu estava trabalhando na organização...

E passeando pelo blog de uma amiga ví o Contar Gotas e lí textos INCRÍVEIS aqui...muitos me emocionaram! Parabéns!

Natália Poças

David Sento-Sé disse...

Grato pelos comentários espero mais gotas de emoção sempre.

Erica Vittorazzi disse...

Eles serão invisíveis até que um dia o destino os faça necessários, aí serão visíveis e terão até nome...

E eu acho isso um absurdo: não falar com garçom, porteiro, babá...