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Menino besta cheio de sonhos aprisonado no corpo de um homem sóbrio e cheio de desejos.

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terça-feira, 18 de outubro de 2011

Parente próximos

Beijaram-se na cozinha como não faziam fazia tempo.
Desde Agosto não se viam e já era Novembro.
A mão bruta, cheia de unhas por aparar, rasgou-lhe as meias de nylon que cobriram as coxas vergadas, por sobre as próprias suas, emolduradas pela saia erguida. Ambos eram só gemidos, amassos e suspiros, misturados a cabelos desalinhados, batom borrado e saliva. O rosto dela, arranhado pela barba mal feita, cobria-se do mesmo rubro que ele escondia nas costas arranhadas. Na blusa de seda prata faltava-lhe um primeiro botão, enquanto no pescoço dele, pendia-se uma gravata de nó, agora tosco, espremido à gola de linho, como se saídos de um atropelamento.
Não emanavam mais perfumes, só suor.
A luz fluorescente, refletida nos azulejos imaculáveis, mal parecia-lhes a meia-luz de um abajur japonês e o cantar dos “ parabéns pra você”, vindo da sala, soava-lhes um tango.
A isso, teóricos chamam volúpia ao passo que os amantes o denominam “excitação”.
E eram beijos e abraços, arfar, torcer e esfregar, numa coreografia sincopada entre o volume involuntário, nascido nas calças dele e a umidade brotando entre as dobras dela.
"Muitos a-nos  -  de  -  vi-da."
Fez-se um “viva”. As velas sopradas trouxeram uma brisa de clareza aos entrelaçados num breve instante de consciência após os aplausos de parentes.
-Meu Deus meus filhos, meu marido, minha casa, meu casamento. Minha segurança. – ela pensou.
- Que coxas, que peitos, que língua, que tesão. – sentenciava o pensamento dele.
Repentinamente, um cão latiu no quintal trazendo-lhes a razão. Culpados, ajeitaram-se como puderam. Afastados, baixaram as vistas, um do outro, como se pena pelo crime fosse.
Sairiam dali calados e em culpa, de volta às realidades cotidianas dos familiares. Apaixonados em silêncio, dissimulados no dia-a-dia, infelizes na verdade.
Talvez no Natal, talvez outra vez, talvez.

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